Na tradição clássica
aristotélica-tomista, a palavra lógica quer dizer um conjunto de estudos que
visa determinar os processos intelectuais que são condição geral do
conhecimento verdadeiro. A lógica pode dissecar sobre a coerência de raciocínio,
de ideias, nesse diapasão é que se pergunta: Deus pode ser visto como uma ideia
lógica? Obviamente, todo ser humano tem uma ideia de Deus, até mesmo o ateu em
sua negatividade.
Os verdadeiros cristãos não têm dúvida quanto a existência
divina, pois sua aproximação a Deus só pode ser por meio de um ato de fé em sua
própria existência (Hb 11.6). Quem merece destaque sobre o logicismo divino é o
arcebispo de Cantuária, o italiano Anselmo (1033-1109), na sua perspectiva
ontológica declara que, por termos uma ideia lógica de Deus, isso prova que Ele
realmente existe.
No seu
“Proslogion”, Anselmo diz que não se pode conceber nada superior a Deus, o mais
imaginável ser que possamos imaginar, repleto de poder, grandeza, bondade,
conhecimento. Com esse assertório ele estava confirmando o absolutismo divino.
Quanto mais o homem pudesse tentar pensar em algo grandioso, ele sempre estaria
pensando em Deus, pois não existe nada mais superior a Ele.
Nessa
linha de pensamento Anselmo não estava sozinho, Boécio afirmava que todo ser
humano pode ter em sua mente a ideia de Deus, porém, o que há de especial no
pensamento filosófico de Anselmo, é que ele não fala somente de um Deus imaginável,
que está apenas em nossa mente, pois nesse caso sua grandeza estaria restrita
tão somente ao mundo mental, não no mundo real, existente.
Temos
que entender que o teólogo Anselmo vai fazer distinção entre o Deus mental e
existente. No caso de se ter apenas uma ideia da existência de Deus os
argumentos estariam na esteira do apriorismo, o que seria um tipo de
conhecimento incerto e injustificado, mas para o Deus real, existente, os
argumentos se baseariam em algo lógico, em provas incontestáveis, as quais
provariam de fato a existência divina.
De uma
forma bem analógica, para dar consistência ao seu argumento, Anselmo deu o
exemplo de um pintor, ele tem em sua imaginação a cena, antes de pintá-la,
depois a coloca em um quadro pintando o que imaginou. Com essa ilustração ele
queria mostrar que a ideia estaria na mente, mas que seria também real.
Mas
com tal citação Anselmo faz um contraste, ele diz que qualquer pessoa pode
imaginar um pintor que nunca pintou um quadro que intentou pintar, mas que não
o fez, de modo que tal quadro só existiria em sua mente, mas jamais no mundo
real. Segundo Anselmo, ninguém pode ter uma ideia de Deus sem que Ele não
exista, a não existência de Deus é impossível, mas só pode entender isso quem
de fato sabe realmente quem Ele é.
É bem
verdade que o pensamento de Anselmo não foi bem convincente para muitos,
especialmente para aqueles que achavam impossível alguém crer em Deus apenas
baseado em seu raciocínio lógico. Esse argumento de Anselmo, conforme ele mesmo
disse, estava pautado no salmo que diz:
“Diz o néscio no seu coração: Não há Deus. Os
homens têm-se corrompido, fazem-se abomináveis em suas obras; não há quem faça
o bem”. (Sl 14:1).
Em
oposição ao pensamento de Anselmo surgiu o monge Gaunilo de Marmoutier, que fez
isso citando o exemplo de uma ilha imaginária, como sendo o mais perfeito lugar
do mundo, tendo todo tipo de frutas, mas dizia que apenas uma ideia perfeita
dessa ilha não a tornava a mais perfeita, ela teria que existir na realidade.
Ele
dizia que se uma pessoa não acreditar na ilha imaginável
e mais perfeita, que realmente ela não existe, então como acreditar na
existência do ser mais perfeito imaginável? Os estudiosos afirmam que Gaunilo
tinha fé em Deus, só que não concordou com o pensamento exposto por Anselmo.
Na
resposta de Anselmo para Gaunilo, ele disse que seu pensamento não funcionava
para ilhas, ainda assim, disse que todas as outras coisas são as mais perfeitas
dentro do seu próprio mundo, ou de sua espécie, mas Deus é o ser absoluto em
sua perfeição, Ele é o único ser que necessariamente existe, jamais poderia
deixar de existir.
Entendemos que o pensamento de Anselmo
desejava expressar não somente a grandeza de Deus, mas sua perfeição. A ideia
de um ser perfeito faz com que sua existência seja necessária, e essa
existência se dá por Ele mesmo (Jo 5.26). Caso esse ser perfeito não tivesse
sua existência, então Ele seria imperfeito.
Os
teólogos afirmam que o argumento ontológico de Anselmo é dedutivo, ou seja,
classicamente, ele parte de uma premissa geral até chegar às particulares, mas
que ele também tem um ponto indutivo.
Todos nós possuímos uma ideia da existência
de Deus, mas o que entra em questão é quanto à sua prova, por isso, seguindo o
pensamento de Anselmo, só mesmo um louco, ao olhar para uma natureza tão bela,
harmoniosa, perfeita em sua criação, negaria a existência de Deus.
O salmista diz que os céus manifestam a
glória de Deus (Sl 19.1-2), Moisés começa o seu livro dizendo que Deus criou
todas essas coisas (Gn 1.1), Paulo diz que, devido o pecado, e a própria
deliberalidade humana, de fazer suas próprias escolhas pecaminosas, desprezando
a Deus, não o conheceram por sua revelação no cosmo (Rm 1.19.20).
Pela lógica humana, quem olha para o
universo, o ser humano, especialmente para a questão teleológica, que é uma
explicação que relaciona um fato com sua causa final, buscando explorar os
aspectos gerais da natureza, logicamente concluirá que realmente Deus existe e
que Ele é o ser mais perfeito (At 14.15-18).
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