quarta-feira, 13 de abril de 2016

A razão e a existência de Deus.


 

            Em contato com o livro de Gênesis, que sem rodeio já se inicia dizendo: “No princípio Criou Deus os céus e a terra...” (Gn 1.1), não há qualquer tentativa de se provar a existência de Deus por meio de um ato racional, mas sim através de uma viva fé em Deus. O Escritor aos Hebreus diz que os que se aproximam de Deus têm que crer que Ele existe (Hb 11.6).
            Não há como negar que Deus fez o homem com capacidade reflexiva, pensante, racional, de modo que o tal vive neste mundo buscando encontrar provas para tudo, inclusive para a existência de Deus, só que nesse particular alguns são céticos, mas outros, com boa razão, frente a tudo que existe, deduz que nada do que existe poderia surgir por si próprio a não ser por meio de um grande arquiteto: Deus.
            A história mostra santos homens piedosos de Deus como Anselmo e Tomás de Aquino que buscaram provar a existência de Deus por vias racionais, sendo que um se distancia do outro por quase dois séculos, não fizeram isso de modo aleatório, sem base, mas sim respaldados na Palavra e nas obras divinas, ou seja, a criação.
Tomás de Aquino, um italiano, tentando provar a existência de Deus, fez isso através da apresentação de cinco pontos racionais em parte de sua obra chamada Suma Teológica. Alguns estudiosos são contra o modo que Tomás tentou provar a existência divina, todavia, temos que entender que não há nada de errado em usar a faculdade racional, posto que ela é um dom de Deus ao homem. Através dela o ser humano pode avaliar, julgar, fazer juízo, como também manifestar bom senso.
            Quando Paulo escreve sua carta aos cristãos de Roma, ele mostra que foi a falta de um olhar racional do homem que o fez tomar o caminho da devassidão, depravação, pois não reconhecia nem via Deus em nada, de modo que se tornou alienado de Deus (Rm).
            Vamos então apresentar as cinco vias de Tomás de Aquino, nas quais ele busca provar a existência divina por meio da razão:

a-      Primeiro Motor. Em relação a esse tópico dizia que Deus é um ser movente que não precisa ser movido por outro ser, se esse ser não existisse seriamos seres indefinidos (Jo 5.26).

b-     Causa eficiente. Temos que concordar que existe uma causa primeira, uma causa eficiente e essa causa primeira é Deus. Tudo que existe no mundo não existe por si mesmo e sim por uma causa eficiente (At 17.32).

c-      Ser contingente e ser necessário. Já falamos que o ser necessário é Deus, Ele é a razão da existência de tudo, existe por si mesmo, é absoluto, é a causa da existência dos seres contingentes (Sl 8.5;At 17.28).

d-     Graus de Perfeição. Nesse ponto dizia que existe o mais ou o menos, ou seja, existem graus de perfeição, uma coisa pode ser mais bela, mais feia, mais verdadeira, mais forte, mais fraco; então, sendo assim, podemos dizer que existe um ser que está em uma categoria maior e melhor, em um estado de perfeição absoluta (Mt 5.48). Deus é a máxima da verdade, do amor, da beleza, do poder, da força, Ele é um ser pleno, total, completo (Tg 1.17).

e-      A Finalidade do ser. Para o Teólogo Tomas de Aquino, tudo que existe na natureza que não possui inteligência própria tem uma função a cumprir em relação à natureza, um objetivo, um alvo a atingir, então, existe um ser inteligente que está no comando, na direção de tudo, isso para que eles cumpram o seu objetivo, seu propósito, já sabemos que esse ser é Deus.
Grande foi a contribuição desse filósofo e teólogo para a história da Igreja, seu mérito nesse particular é inquestionável, como dizia Jacques Maritain a respeito do pensamento de Aquino:

Não só transportou para o domínio Cristão a filosofia de Aristóteles na sua integridade, para fazer dela um instrumento de uma síntese teológica admirável, como também ao mesmo tempo superlevou e, por assim dizer, transfigurou essa filosofia. Purificou-a de todo o vestígio de erro, sistematizou-a poderosa e harmoniosamente, aprofundando-lhe o princípio, destacando as conclusões, alargando os horizontes, e se nada cortou, muito acrescentou, enriquecendo-a com o imenso tesouro da tradição latina e cristã.”
Para alguns, Aquino era chamado de doutor angélico ou doutor por excelência. Mas  tem aqueles que não concordam com tal mérito aplicado a ele, como por exemplo o filósofo Bertrand Russel, que questiona os méritos que são aplicados a esse filósofo, veja o que ele diz:
Há pouco do verdadeiro espírito filosófico em Aquino, não está empenhado numa pesquisa cujo resultado não possa ser conhecido de antemão. Antes de começar a filosofar, ele já conhece a verdade, está declarada na fé católica. Se, aparentemente, consegue encontrar argumentos racionais para algumas parte da fé, tanto melhor; se não, basta-lhe voltar de novo à revelação. A descoberta de argumentos para uma conclusão de dada antemão não é filosofia, mas uma alegação especial. Não posso, portanto, admitir que mereça ser colocado no mesmo nível que os melhores filósofos da Grécia ou dos tempos modernos.”
Sabemos que nos períodos da Renascença como também da Idade moderna continuaram a questionar o mérito aplicado a Aquino, todavia, mesmo diante de tais concepções ninguém pode negar que ele foi um grande pensador no período Medieval.
Na linha teológica de Aquino não existe o que pode ser denominado de regresso infinito, todavia, toda causa tem um efeito e, ademais, o regressar de qualquer coisa sempre vai esbarrar no ser eterno: Deus, o criador de todas as coisas.
Para entendermos melhor esse assunto basta pensarmos em uma bonita cadeira feita de matéria e que passou por diversas transformações até que chegasse à sua perfeição, mas no seu regressar não existe uma infinitude sem causa e efeito, na verdade, ficará claro que Deus é o criador da matéria da qual ela é feita.

 

 

quarta-feira, 6 de abril de 2016

Logicismo Divino



            Na tradição clássica aristotélica-tomista, a palavra lógica quer dizer um conjunto de estudos que visa determinar os processos intelectuais que são condição geral do conhecimento verdadeiro. A lógica pode dissecar sobre a coerência de raciocínio, de ideias, nesse diapasão é que se pergunta: Deus pode ser visto como uma ideia lógica? Obviamente, todo ser humano tem uma ideia de Deus, até mesmo o ateu em sua negatividade.

            Os verdadeiros cristãos não têm dúvida quanto a existência divina, pois sua aproximação a Deus só pode ser por meio de um ato de fé em sua própria existência (Hb 11.6). Quem merece destaque sobre o logicismo divino é o arcebispo de Cantuária, o italiano Anselmo (1033-1109), na sua perspectiva ontológica declara que, por termos uma ideia lógica de Deus, isso prova que Ele realmente existe.

No seu “Proslogion”, Anselmo diz que não se pode conceber nada superior a Deus, o mais imaginável ser que possamos imaginar, repleto de poder, grandeza, bondade, conhecimento. Com esse assertório ele estava confirmando o absolutismo divino. Quanto mais o homem pudesse tentar pensar em algo grandioso, ele sempre estaria pensando em Deus, pois não existe nada mais superior a Ele.

Nessa linha de pensamento Anselmo não estava sozinho, Boécio afirmava que todo ser humano pode ter em sua mente a ideia de Deus, porém, o que há de especial no pensamento filosófico de Anselmo, é que ele não fala somente de um Deus imaginável, que está apenas em nossa mente, pois nesse caso sua grandeza estaria restrita tão somente ao mundo mental, não no mundo real, existente.

Temos que entender que o teólogo Anselmo vai fazer distinção entre o Deus mental e existente. No caso de se ter apenas uma ideia da existência de Deus os argumentos estariam na esteira do apriorismo, o que seria um tipo de conhecimento incerto e injustificado, mas para o Deus real, existente, os argumentos se baseariam em algo lógico, em provas incontestáveis, as quais provariam de fato a existência divina.

De uma forma bem analógica, para dar consistência ao seu argumento, Anselmo deu o exemplo de um pintor, ele tem em sua imaginação a cena, antes de pintá-la, depois a coloca em um quadro pintando o que imaginou. Com essa ilustração ele queria mostrar que a ideia estaria na mente, mas que seria também real.

Mas com tal citação Anselmo faz um contraste, ele diz que qualquer pessoa pode imaginar um pintor que nunca pintou um quadro que intentou pintar, mas que não o fez, de modo que tal quadro só existiria em sua mente, mas jamais no mundo real. Segundo Anselmo, ninguém pode ter uma ideia de Deus sem que Ele não exista, a não existência de Deus é impossível, mas só pode entender isso quem de fato sabe realmente quem Ele é.

É bem verdade que o pensamento de Anselmo não foi bem convincente para muitos, especialmente para aqueles que achavam impossível alguém crer em Deus apenas baseado em seu raciocínio lógico. Esse argumento de Anselmo, conforme ele mesmo disse, estava pautado no salmo que diz:

 “Diz o néscio no seu coração: Não há Deus. Os homens têm-se corrompido, fazem-se abomináveis em suas obras; não há quem faça o bem”. (Sl 14:1).

Em oposição ao pensamento de Anselmo surgiu o monge Gaunilo de Marmoutier, que fez isso citando o exemplo de uma ilha imaginária, como sendo o mais perfeito lugar do mundo, tendo todo tipo de frutas, mas dizia que apenas uma ideia perfeita dessa ilha não a tornava a mais perfeita, ela teria que existir na realidade.

Ele dizia que se uma pessoa não acreditar na ilha imaginável e mais perfeita, que realmente ela não existe, então como acreditar na existência do ser mais perfeito imaginável? Os estudiosos afirmam que Gaunilo tinha fé em Deus, só que não concordou com o pensamento exposto por Anselmo.

Na resposta de Anselmo para Gaunilo, ele disse que seu pensamento não funcionava para ilhas, ainda assim, disse que todas as outras coisas são as mais perfeitas dentro do seu próprio mundo, ou de sua espécie, mas Deus é o ser absoluto em sua perfeição, Ele é o único ser que necessariamente existe, jamais poderia deixar de existir.

Entendemos que o pensamento de Anselmo desejava expressar não somente a grandeza de Deus, mas sua perfeição. A ideia de um ser perfeito faz com que sua existência seja necessária, e essa existência se dá por Ele mesmo (Jo 5.26). Caso esse ser perfeito não tivesse sua existência, então Ele seria imperfeito.

 Os teólogos afirmam que o argumento ontológico de Anselmo é dedutivo, ou seja, classicamente, ele parte de uma premissa geral até chegar às particulares, mas que ele também tem um ponto indutivo.

Todos nós possuímos uma ideia da existência de Deus, mas o que entra em questão é quanto à sua prova, por isso, seguindo o pensamento de Anselmo, só mesmo um louco, ao olhar para uma natureza tão bela, harmoniosa, perfeita em sua criação, negaria a existência de Deus.

O salmista diz que os céus manifestam a glória de Deus (Sl 19.1-2), Moisés começa o seu livro dizendo que Deus criou todas essas coisas (Gn 1.1), Paulo diz que, devido o pecado, e a própria deliberalidade humana, de fazer suas próprias escolhas pecaminosas, desprezando a Deus, não o conheceram por sua revelação no cosmo (Rm 1.19.20).

Pela lógica humana, quem olha para o universo, o ser humano, especialmente para a questão teleológica, que é uma explicação que relaciona um fato com sua causa final, buscando explorar os aspectos gerais da natureza, logicamente concluirá que realmente Deus existe e que Ele é o ser mais perfeito (At 14.15-18).